Foto cedida por Magno Herrera Fotografias
“O
AMOR DE MÃE SUPERA TUDO”
Foi
tudo por ele, sempre.
Os
meus melhores e piores momentos, minhas mais ternas emoções por este filho que
Deus me enviou. Eu era tão moça, tão jovem. Casei com um homem que eu amava e
desejei ser mãe desde sempre. Quando era pequena brincava com minhas
bonequinhas e era apaixonada pela ideia de, um dia, poder segurar um bebê, de
alimentar e educar um bebê, o meu filho.
Casei
e recebi a graça de engravidar. Meu marido me tratava bem com carinho, mas de
repente, percebi que ele estava diferente, mudado. Chegava em casa tarde e
passou a me desprezar, mas me contive porque imaginei que fosse por causa da
gestação, afinal, pode acontecer do marido repudiar a esposa, era o que me
diziam. Eu estava tão feliz com minha fase de gestante que deixei para lá, não
queria estragar minhas emoções por causa da desavença com meu esposo. Eu estava
tão agradecida por ele ter me dado um filho, eu o amava tanto por isso.
Os
meses ser passaram e sem que eu pudesse perceber, meu marido se distanciava de
mim, cada vez mais e arquitetou um plano. Ele estava me traindo e não me queria
mais. Ele quis se separar de mim e eu sofri muito, mas nem tanto porque sabia
que não estaria sozinha, eu tinha meu filhinho e isso era tudo o que importava
para mim, mas a nova mulher do meu esposo julgou que eu não poderia criar meu
filho com dignidade e deveria abdicar da criação dele.
Eu
não acreditei quando Marcelo me falou com todas as palavras isso que estou
descrevendo. Eu que sempre desejei um filho, eu que sempre fui mulher honesta e
trabalhadora, eu que sempre fui boa esposa deveria perder o meu marido e ainda
abdicar do meu bebê?
Mas
como?
Seria
possível uma coisa dessas?
Eu
estava quase para ganhar o meu nenê e era obrigada a ouvir isso. Chorei e não
pude mais esperar. Eu arrumei minha mala e voltei para a casa dos meus pais,
afinal, eu tinha família. E foi isso o que eu ouvi dos meus pais maravilhosos.
A revolta tomou conta dos meus familiares, aquilo era um absurdo. Tomar o meu
bebê...
O
momento esperado chegou e eu estava angustiada com o que poderia acontecer. Eu
tive medo que alguém me dissesse que eu teria que entregar meu filho para eles.
Quando o Miguel nasceu foi o dia mais feliz da minha vida e toda a dor do parto
normal ainda não foi suficiente para me tirar o sorriso do rosto, para reduzir
o meu contentamento de tê-lo em meus braços. Foi mágico, perfeito.
Continuamos
com meus pais, o Marcelo veio ver o bebê e chorou. Naquele momento acho que ele
foi tomado pelo arrependimento porque nós tínhamos tudo. Ele não precisava ter
buscado nada fora de casa. Ele me pediu perdão e disse que eu deveria retornar
para nossa casa. Perguntou se eu poderia deixar para trás tudo o que ocorreu e
aceitá-lo como esposo e pai do menino. Eu ainda o amava e estava tão feliz, tão
emocionada. Eu sempre quis a minha família e merecia tê-la.
Eu
voltei para o meu lar com meu troféu que era o Miguel. Fiquei casada quarenta
anos com o Marcelo e fui muito bem tratada depois desse inconveniente, dessa
traição. Nunca mais tive motivos para falar do meu esposo. Tivemos outros
filhos que foram igualmente importantes e compreendi que O AMOR DE MÃE SUPERA TUDO. Supera qualquer adversidade, qualquer
problema e nos torna pessoas muito divinas. Graças a Deus.
MICHELE
05/05/18
--------------------------------Paula
Alves------------------------------
“PARECE
QUE SÃO ANJOS MESMO”
Imagina!
Tirar filho de mãe!
Eu
sempre dizia isso e duvidava quando me falavam que eu podia perder a guarda das
crianças. Nunca um seu alguém vai tirar filho de mãe, mas eu abusei. Sei que
você vai falar que eu fiz tudo aquilo porque fui uma criança abandonada, tive
problemas existenciais e nunca poderia doar afeto porque tinha os sentimentos
atrofiados pela ausência de amor que devia ter recebido de minha mãe, mas não é
só isso. Foi maldade mesmo e eu tenho consciência disso.
Fui
mãe e tive dez filhos. No início foi descuido, namoradeira, quando vi estava
grávida. Me deu até raiva. Só de pensar que tudo ia mudar por causa daquela
barriga. Não teve jeito e quando percebi estava parindo. Foi um horror, eu
nunca tive jeito para essas coisas. Sofrimento demais. Do início ao fim só dor
e miséria. O pai da criança eu nem sabia quem era. Fiquei sozinha mesmo e foi
bem ruim porque meu pai quis acabar comigo e me colocou para fora de casa, eu
fui pra casa da minha tia. Só ouvia xingo e humilhação. Ninguém nunca me falou
que era coisa boa ter filho, só desgraça. Eu ia pensar o quê? Beleza, o menino
nasceu e eu toda arruinada por baixo nem quis saber do moleque. Cheia de raiva
da criança que chorava o tempo todo e ainda tinha que cuidar daquela criatura
dia e noite toda cansada. Quis dar, mas ninguém queria o menino, então tive que
ficar com ele. Logo arrumei um romance e juntei os trapos. Tive mais três
filhos deste homem que resolveu ir embora me deixando as crianças. O jeito foi
pedir, fui para o farol e ensinei a pedir. Mas, como tem gente boba no mundo
ensinei a cometer pequenos delitos, só roubinho a toa, não prejudicou ninguém,
mas aqui tudo é seriedade e eu já fui repreendida porque falaram que eu mexi
com a cabeça dos meninos, ensinei o caminho errado e tinha que ensinar só fazer
o bem.
Eu
não podia ser mãe porque não sabia ensinar fazer o bem. O problema é que tem
gente boa por aí. Eu achei um homem que me quis com os quatro e se juntou
comigo. Tive mais seis com ele e se não fosse tão torta eu tinha virado gente.
Eu não tinha afeto para dar, mas meus filhos eram bons comigo, sempre foram.
Impressionante como criança tem o que ensinar pra gente. Parece que são anjos
mesmo. Você fala pra roubar e vem cheio de lição de moral, dá até raiva. Você
ensina a seguir errado e eles tentam corrigir a gente. Eu fui envelhecendo e
eles crescendo, tornando homem e mulher. Cuidando de mim. Nunca me negaram
nada. Tudo com empreguinho direito, sempre seguindo o rumo certo. Nem sei de
onde tiravam tanta bondade porque eu nem ensinei, eles que me ensinaram que eu
sou ruim. Chegavam abraçando e beijando, querendo carinho, coitadinhos (choro)
e eu não conseguia abraçar.
Por
que é que eu não consigo?
Eu
tentei no fim. Eu já estava velha e querendo bater. Velha e ralhando. Vendo
defeito em tudo o que faziam e todos bons comigo. Eu tive muito mais do que
mereci, sempre. Eu sinto vergonha, me arrependo, mas não sei doar. Eu lembro o olhar
do meu mais velho que foi o que mais sofreu e eu sinto remorso. Será que, se eu tivesse me esforçado mais,
tinha nascido amor em mim?
Eu
ouvi falar do amor de mãe e eu ganhei amor dos meus filhos. Sou muito ruim
mesmo.
ANÁLIA
05/05/18
------------------------------Paula
Alves-----------------------------
“EU
ACHEI DE VERDADE QUE ISSO ERA SER MÃE”
Eu
batia sim, batia porque eu tinha que transformar em gente decente. Você não tem
ideia de como eram meus filhos. Estavam sempre aprontando, sempre fazendo arte
e eu era a mãe. Eu tinha que ensinar. Se você não ensina desde novo, não
corrige nunca mais. Na minha época era bem pior, o pai batia com varinha de
marmelo. Ficava até sem comer para aprender a respeitar os mais velhos, os superiores.
Na minha casa eu só olhava, tinham um medo que se pelavam todos.
Era
bonito de ver na igreja todos quietinhos. Via os filhos da vizinha correndo
antes da missa e os meus firmes, nem se mexiam. Eu ficava orgulhosa, mas no que
deu tanta imposição?
Eu
achei de verdade que isso era ser mãe. Eu achei que se fizesse carinho eles iam
ficar sem vergonha. Tinha vez que eu até sentia vontade de brincar com eles,
fazer um cafuné, mas depois eu pensava que se fizesse isso, eles iam achar que
eu era fraca e ia dar muita confiança pra eles. Sempre fui firme, dura, acho
que dura demais. Eu os amava muito, fiz achando que era meu papel.
Cresceram
meus filhos e eu percebi em todos eles o desespero para sair de casa. Minhas
filhas arrumaram logo o casamento e eu achei bom porque não queria filha
desonrada, mas o casamento não prestou, de nenhuma delas. Duas voltaram para minha
casa e a outra foi viver por aí, só me deu dor de cabeça a Laura. Os meninos, então,
foi pior porque arrumaram emprego em outra cidade e o que casou foi com uma
mulher que mandava nele, que vontade que eu tinha de acertar aquela nora. Tão
impetuosa e agressiva com meu filho coitado, sofreu com aquela mulher.
Eu
fui ficando tão sozinha, a casa não era mais como antes e quando apareciam para
me visitar nem se demoravam numa conversa, nem queriam provar do meu almoço,
nada. Eu percebi sim, eu notei e senti. Me pergunto se fiz tudo errado porque a
casa daquela vizinha sempre esteve cheia de filhos e a minha não.
AUGUSTA
05/05/18
--------------Paula
Alves-----------------
“EU
FUI MÃE SIM. APESAR, DE TUDO O QUE FIZ DE ERRADO”
Infelicidade
quando recebi do médico a informação de que não poderia mais ser mãe. Eu fiz de
supetão. Eu nem pensei no futuro só não queria levar problemas para os meus
pais. Engravidei do meu namorado, mas eu era tão jovem. Sabia que não tinha
condição para casarmos e termos o bebê.
Ele
me ajudou em tudo e eu tentei tirar a criança. Nem sei o que foi que deu errado
e eu tive que ser socorrida, mas demorou. No hospital todo mundo percebeu o que
eu tinha feito e as enfermeiras lançavam olhares de revolta para mim, doía
muito e eu achei que perder tanto sangue fosse me matar, mas não, só matou o
bebê. Pura imprudência! Não pense que me
alegra ou me orgulho do que eu fiz, pelo contrário. O arrependimento bateu
ali mesmo, quando senti que tudo havia acabado e alguém sofria assim como eu,
um inocente. Um arrependimento que me dilacerou e me fez sentir horror de mim
mesma para sempre, até agora.
Como
pode perdurar para além da vida do corpo?
Só
Deus para explicar. Enfim, o médico cuidou de mim e limpou todo o estrago que
eu fiz com meu corpo, mas precisou remover o meu útero. Sim, aquele que deveria
alojar outro feto se foi. Perdi completamente a chance de ser mãe com aquela
imprudência e soube que iria sofrer para sempre.
Continuei
minha vida sendo apontada por muitos anos porque todos onde eu morava souberam
do que fiz. Anos se passaram e eu conheci um jovem bom com quem me relacionei e
me propôs casamento. Eu precisei ser honesta e dizer que não podia ser mãe e
ele disse que não poderia continuar nosso romance porque desejava ter família.
Eu já estava colhendo os frutos de minha irresponsabilidade.
Passaram
mais sete anos, conheci o Luís Sérgio e novamente pensei que seria abandonada,
mas me enganei. Ele se tornou meu esposo e me amou demais. Me auxiliou e
conseguimos adotar a Marília que chegou em nosso lar com dois anos e meio, ela
veio trazer a luz para minha vida. Depois veio a Viviane que chegou com cinco
aninhos e foi tão boa para nós e para a irmã. Eu ainda queria mais e recebemos
o Téo (Teodoro) que nos encheu com seu entusiasmo. Eu fui mãe sim. Apesar, de
tudo o que fiz de errado, Deus ainda me contemplou com uma linda família. Creio
que meus filhos nada se diferem dos filhos das outras mães porque não foram
gerados por mim. Nós nos amamos tanto, tanto. Eu pude nutrir o mais terno amor,
pude adquirir as mais belas virtudes por meio da maternidade e cheguei a pensar
que Deus sabe mesmo de todos os nossos passos. Eu acho que Ele sabia das minhas
escolhas que tudo iria fazer chegar nessas criaturas abençoadas que foram
abandonadas por suas mães de sangue para chegarem nos meus braços. Eu sou muito
feliz.
LUCIANA05/05/18
-------------------Paula Alves-----------------
Foto cedida por Magno Herrera Fotografias
“MINHA MÃE É UM SER TÃO ILUMINADO”
Éramos
só nós duas. Meu pai morreu jovem depois que sofreu um acidente no local em que
trabalhava. Minha mãe sofreu muito. Ela nem conseguia acreditar que meu pai
tinha morrido. Eu tinha nove anos. Chorei quando vi que nunca mais meu pai
voltaria para casa, mas minha mãe foi tão terna e delicada me explicando que o
papai precisava ir com Deus. Eu achei bonito imaginar que meu pai estaria ao
lado de Deus, devia ser uma honra pro meu pai e eu sorri. Desejei que fosse
verdade e sempre pensava nele deste jeito.
Nós
prosseguimos e minha mãe nunca reclamou. Ela arrumou serviço na casa de uma
senhora bondosa. Ela permitiu
que eu ficasse com minha mãe. Ela trabalhava duro e fomos bem tratadas.
Logo, comecei a trabalhar e a vida foi ficando um pouco mais fácil. Ela era
tudo para mim. Minha amiga, meu pai, meu alicerce, minha fortaleza. A mulher
mais sábia que eu conheci.
Aos
poucos, fui notando que a saúde dela estava frágil e fiquei preocupada. Nem sei
explicar, mas era como se fosse meu bem mais precioso e eu nem poderia imaginar
minha vida sem ela. Fui atrás de um médico, fizemos exames e tivemos a certeza
de que ela tinha um problema grave no coração. Ela parou de trabalhar, mas era
complicado para mim, sair e deixá-la sozinha? Eu trabalhava preocupada o dia
todo. Um sofrimento danado você ficar imaginando o que pode acontecer com quem
você ama.
Deus
me presenteou colocando um bom homem no meu caminho. O Otávio apareceu e me
encheu de felicidade. Minha mãe gostou dele e aprovou nosso relacionamento. Ela
era tão especial que também se preocupava com minha solidão e falava sempre que
eu devia me casar para não ficar sozinha, mas eu não me preocupava com a
solidão. Eu me preocupava com a ausência dela.
Eu
me casei e minha mãe esteve presente no casamento, dois dias depois ela
faleceu. Eu não consegui entender. Chorei e me desesperei. Parecia que tinham
tirado um pedaço de mim. Eu sofri com o que nós ainda não tínhamos vivido, ela
não iria ver meus filhos, nem abraçá-los. Eu precisava dela para conversar e
receber o afeto de sempre. Eu me culpei achando que poderia ter tratado do
coração antes, mas como? Eu levei anos me perguntando por que Deus havia tirado
minha mãe de mim e sei que não deveria ter sido leviana com o Pai, mas eu fiz
isso. Eu não sabia que a morte não existe. Eu não reconheci nossa imortalidade
e achei que estava ficando sem ela para sempre. Na verdade, há pouco tempo
compreendi que ela sempre esteve perto, à medida que obteve permissão para
isso. Minha mãe é um ser tão iluminado. Ela não sofreu, recebeu socorro
imediato e esteve aguardando a possibilidade de me auxiliar porque eu sim
sofri.
Depois
de tantas décadas, depois de ter construído uma linda família, ainda assim, não
aceitava o desencarne dela e vaguei por um tempo após meu desencarne. Eu vaguei
perdida no delírio da revolta e da incompreensão. Ela me observava, mas nada
podia fazer porque eu devia voltar ao Pai e voltei. Quando voltei, ela estava
aqui, esperando por mim. Sou feliz, agradecida, mas compreendo que devo me
tratar porque a posse me fez sofrer. Eu
preciso compreender tantas coisas. O desencarne como coisa natural e o amor com
liberdade.
CLAUDETE
13/05/18
---------------------------Paula Alves----------------------
“TODOS
OS ADJETIVOS SERIAM POUCO PARA DESCREVER MINHA MÃE
PORQUE ELA ME ENSINOU A SER BOM E CORAJOSO”
Faltava
tudo. Quanto desespero! Eu cresci assim,
com carência de bens materiais. Via minha mãe contar moedas para tudo. Tinha
mais três irmãos mais jovens e eu via minha mãe correr de um lado para outro
para dar conta do serviço, da casa e das crianças. Eu fazia o que podia para
ajudar e não me queixava porque eu achava bonito ver o quanto ela se esforçava
por nós. A pobreza doía no corpo emagrecido e, um dia, já na adolescência,
comecei a questionar por que nós não tínhamos pai. Eu concluí que nossa vida
era bem mais difícil que a dos nossos amigos que tinham pai e mãe. Eu achei que
fosse culpa dela porque nosso pai não estava em casa com a gente. Ela nunca
falava dele e eu pensava tanta coisa ruim. Pensei que ele fosse criminoso, que
fosse casado e que tinha rejeitado a gente. Minha mãe poderia ter fugido e
abandonado meu pai tornando nossa vida insuportável.
Ela
não queria comentar e eu fiquei sem saber o porquê de tanta dificuldade. Eu
precisei crescer para trabalhar e perceber que ela não queria denegrir a imagem
de pai que podíamos ter. Foi meu pai que nos abandonou justificando que em outra
cidade a oportunidade de emprego era maior. Ele jurou que voltaria para nos
buscar e isso nunca aconteceu.
Eu
pedi perdão para minha mãe quando ela me contou isso porque a vida toda eu fiz
com que ela se lembrasse do abandono, mas não foi por maldade. Eu agradeci a
Deus pela mãe que nós tivemos tantas vezes e ainda agradeço. Ela foi tudo. Foi mulher de fibra, foi
leal, foi delicada e honrada também. Todos os adjetivos seriam pouco para
descrever minha mãe porque ela me ensinou a ser bom e corajoso. Ela me ensinou
a ser um homem.
Eu
me casei, tive mulher e filhos. Todas as vezes que eu tinha dúvida de como
proceder, imaginava o que ela faria, como escolheria o melhor caminho. Ela me
ajudou até quando esteve afastada de mim.
Quando
cheguei aqui tive a bendita noticia que iremos nos reencontrar novamente. Eu
estou muito feliz porque agora seremos irmãos. Ela é uma pessoa boa demais. Sei
que, de alguma forma, nos reconheceremos.
ADALBERTO
13/05/18
-------------------Paula
Alves--------------------
“EU SENTI FALTA DE ALGUÉM PARA ME COBRIR
DE AFETOS”
Nosso
relacionamento sempre foi complicado. Parecia que ela fazia de tudo para me
perturbar e o pior é que ela me dizia a mesma coisa. Dentro de casa era só
gritaria e eu já estava enlouquecendo. Eu tinha pai, irmãos, mas meu problema
sempre foi com minha mãe. Eu sentia até inveja do relacionamento que ela tinha
com meus irmãos e também tive inveja dos meus amigos porque via como eram
tratados pelas mães.
Eu
passei a vida toda tentando entender por que a gente não podia nem se olhar.
Estranho porque ela era boa. Eu sabia apreciar diversas qualidades da minha
mãe, mas não comigo.
Faltava
paciência sabe?
Ela
sempre falou que não devia ter engravidado de mim, contava uma história triste
de quando estava grávida, teve complicações de saúde e precisou fazer repouso,
sofreu...
E eu
tinha que ouvir a história e saber que ela tinha sofrido por minha causa.
Estranho!
Fui
levando, sem entender as surras que só eu levava. Sem saber por que eu não
podia comer o que eu queria dentro de casa porque tinha que deixar para os
outros, mas na minha vez ela nem ligava quando acabavam com tudo.
Todo
mundo tenta explicar e falar que eu era terrível, mas eu nunca fui, era bem o
contrário. Eu tentava ser o aluno exemplo, consegui uma boa chance de emprego
porque sempre fui disciplinado e estudioso. Eu nunca soube explicar. Quando ela
estava para desencarnar, me chamou e pediu desculpas porque ela também sentiu,
a vida toda, constrangimento em me fazer um carinho, dizer que me amava. Ela
queria me tratar como os outros, mas não conseguia. Ela falou que a gente devia
ser muito parecido e “o santo não batia”.
Eu
só entendo agora, mas ainda não superei. Eu compreendi que fizemos mal um para
o outro em outras existências. Eu me lembrei de um amor não correspondido e
demorei para aceitar que aquela dama era minha mãe. Eu vi a minha amargura e
minha revolta. Eu consegui enxergar em mim, o homem que tantas vezes a
perseguiu, mas tudo devia ter ficado para trás com esta chance de sermos mãe e
filho. Eu ainda sinto as dores daquelas surras. Eu senti falta de alguém para
me cobrir de afetos. Ela estava ali para isso e ela se recusou.
Quem
tem culpa disso?
Como
eu posso esquecer?
ALCEU
13/05/18
--------------------Paula
Alves---------------
“NÓS
SÓ CONSEGUIMOS ENTENDER UM POUCO NOSSAS MÃES QUANDO TAMBÉM NOS TORNAMOS MÃES”
Foi
ela quem falou que eu deveria ouvir o que ela dizia, senão poderia me arrepender.
Eu duvidei que minha mãe teria coragem de fazer o que fez para defender os
interesses da família. Eu sei que agi errado e me envolvi com um homem casado.
Minha mãe ficou irada quando soube e disse que eu não podia prejudicar a
família por causa de ato insano.
A
gravidez fez com que ela agisse planejando meu futuro e eu não pude acreditar
que continuaria com aquilo. Ela me afastou de tudo e ficamos ausentes no
interior durante toda a gravidez. Quando meu filho nasceu, ela simplesmente
organizou tudo para entregá-lo para outra família. Eu ainda estava debilitada
por causa do parto, mas quando percebi o que ela desejava fazer, virei uma
onça. Gritei com ela que se espantou porque eu nunca a havia afrontado. Peguei
meu bebê e disse que jamais o tirariam de mim. Minha mãe pensou e rapidamente
sugeriu que eu fosse embora porque não irai voltar para casa conosco. Falou que
ela poderia esquecer os meus desaforos, mas não queria o bastardo. Eu nem
respondi, arrumei as poucas coisas que tinha, peguei o bebê e saí.
Eu
precisei contar com o apoio de pessoas bondosas que Deus foi colocando no meu
caminho para superar esta situação e criar meu filho com o mínimo de dignidade.
Quando criei coragem me apresentei ao restante da minha família exigindo alguns
recursos do quais eu sabia ter direito. Meu pai e irmãos se surpreenderam com o
que contei e tivemos uma longa discussão. Meu pai não sabia do menino e pediu
que eu voltasse para casa, minha mãe afirmou para todos que eu havia fugido com
um namorado.
Eu
voltei para facilitar a criação do meu menino, afinal nós estávamos morando de
favor. Nós duas nunca nos entendemos porque eu era a vergonha da minha mãe. Eu
que também era mãe e amava tanto o meu filho não conseguia entender como ela
podia passar tudo na nossa frente.
Ela
se preocupava com questões absurdas relacionadas à sociedade e aos recursos
financeiros. Eu só queria amar. A maternidade para mim era o auge da minha
existência. Era o amor mais sublime que eu tinha alcançado e comecei a sentir
pena da minha mãe porque ela mostrava claramente que não sabia amar. Eu
agradeci a Deus por ter aproveitado meu filho enquanto estivemos juntos e
depois que percebi tudo isso ficou um pouco mais fácil ficar perto dela. Nós só conseguimos entender um pouco nossas
mães quando também nos tornamos mães.
CINTIA
13/05/18
---------------------------Paula Alves-------------------------
Foto cedida por Magno Herrera Fotografias
“EU NÃO PRECISAVA TER ARRUINADO MINHA
VIDA POR CAUSA DO ORGULHO, VERGONHA DE PEDIR”
No
início foi por necessidade. Eu precisava comprar leite para o meu filho e o
dinheiro havia acabado. Eram muitas as despesas, tinha o aluguel e a Maria
Clara tinha adoecido. Minha esposa sempre foi tão forte, mas naquele mês choveu
tanto e a coitada lavando roupa, levando roupa pra cima e pra baixo, pegou
pneumonia e eu precisei de dinheiro para o remédio.
Eu
trabalhava no caixa e era um funcionário de confiança. Eu nunca havia me envolvido
em nada ilícito. Nunca havia cometido roubo, furto, nenhum ato de violência.
Naquele dia, o menino estava sem leite e nem pensei duas vezes, roubei. Eu só
peguei a quantia certinha para comprar o leite e justifiquei o ato porque o
menino teve contentamento quando ingeriu o leitinho. Fui dormir na certeza que,
assim que recebesse, iria devolver a quantia que peguei no caixa, então, não
seria mais roubo, seria empréstimo.
Só
que não foi isso o que aconteceu. Quando eu cheguei ao trabalho, me deparei com
meu chefe nervoso por causa da mulher dele e achei muito revoltante ele descontar
tudo nos funcionários. Era uma situação estranha de humilhação e desprezo. Nenhum
chefe deveria tratar um funcionário, desta forma, porque ele sabia que nós não
iríamos dizer verdades que ele merecia ouvir porque ninguém queria confusão com
chefe. Ninguém queria perder o emprego. Ele gritava e humilhava uns e outros.
Ninguém escapava do nervoso daquele homem.
Eu
senti raiva e indignação. Pensei no furto e ri, no fundo, eu achei bem feito.
Ele bem que merecia o que eu tinha feito e, depois disso, comecei a roubar por
puro prazer de vingança.
Roubei
bastante, de forma discreta, mas roubei tanto que consegui até comprar um
carrinho. Minha esposa estranhou e eu tive que mentir para ela, falando que
tinha sido promovido e ela ficou toda feliz. Minha esposa era um poço de
virtude. A mulher não ficava com uma moeda que tinha sido dada no troco por
engano, ela devolvia. Ela fazia todo o serviço de faxina com a maior
honestidade. Não saia antes da hora e tentava fazer, além do que era combinado,
para cativar a patroa. Todos gostavam dela, não faltava serviço.
Era
difícil, ela chegava sempre bem cansada depois de pegar ônibus cheio e ela
ficou feliz em pensar que eu havia sido promovido. A situação poderia ter sido
boa para mim, se minha esposa não fosse tão correta e cheia de escrúpulos.
Parecia até que ela sabia que eu estava aprontando, eu sei que ela nunca me
perdoaria. Ela se orgulhava de falar para nosso filho que éramos pobres
íntegros, bons trabalhadores. Parecia que tudo o que ela dizia estava sendo
indireta para mim. Eu comecei a me ofender e a me irritar no lar, com minha
amada esposa. Ia dormir com a cabeça quente, só pensava em dinheiro e no que eu
queria adquirir. Fiquei tão ganancioso e, aos poucos, nos tornamos diferentes.
Ela parecia tão pobre, tão acomodada, sem ambição.
Eu
não dormia direito e me irritava com o sono pesado da minha esposa. Ela dormia
como um anjo e eu nunca mais dormi direito. Hoje eu sei que minha consciência
estava me cobrando das minhas faltas. Foi indo, me separei dela, não antes de
tê-la traído e de ter ferido seus nobres sentimentos. Eu joguei fora uma vida
simples, mas cheia de paz e honestidade.
O
fim veio com a bebida, com as farras. Fui descoberto porque fiquei deveras
ganancioso e passei a roubar somas cada vez maiores. Me prenderam e foi na
cadeia que paguei tudo o que devia, sofri bastante. Lá, tive tempo de pensar na
Maria Clara e no meu filho. Me arrependi e tive um desejo enorme de voltar no
tempo e não fraquejar. É certo que tudo começou por causa da fome do meu menino,
mas sempre tem o caminho do bem. Se eu tivesse pedido dinheiro para algum
familiar ou um amigo, ninguém iria me negar. Eu não precisava ter arruinado
minha vida por causa do orgulho, vergonha de pedir.
Depois
que desencarnei, ficou pior para mim porque eu senti as orações deles. Maria
Clara e meu filho Gabriel sempre fizeram orações por mim e eu sentia amor vindo
deles, chorei tanto, me arrependi por demais. Eu não consigo me esquecer do que
fiz e me arrependo. Eu joguei uma vida boa no lixo por causa da ganância.
SAMUEL
19/05/18
-----------------Paula
Alves-------------
“NÃO
SE DEVE MATAR NENHUM INSETO, QUEM DIRÁ UMA PESSOA”
Era
um plano perfeito. Ninguém jamais suspeitaria de mim. Sempre fui uma esposa tão
boa, acima de qualquer suspeita. Tive que suportar o temperamento daquele
marido por quarenta anos.
Me
casei novinha com um homem muito mais velho do que eu porque meu pai não dava
conta dos filhos que foi fazendo. Fui entregue como uma porca. Casei
contrariada, sofri sem carinho, tudo na marra. A sorte é que o desgramado
ganhou muito dinheiro. Foi aumentando os bens da família e quando percebeu
estava rico. Eu fui obrigada a engravidar muitas vezes e fiquei cuidando da
família, sem ter direito de falar nada, senão ainda era esmurrada. Foram
quarenta anos, critique se puder.
Até
que ele ficou doente e parecia que Deus estava entregando toda a conta do que ele
havia me feito. Parecia que ia pagar tudo o que havia me judiado, mas percebi
que era eu quem estava pagando a conta dele porque ele ficou inerte, mas ainda
era mal criado. Eu fazia tudo porque ele não tolerava que ninguém o
higienizasse, nem desse comida para ele. Os filhos ainda achavam que tinha que
ser com o maior carinho, mas que carinho?
Eu
nem sabia o que era isso vindo daquele homem. Eu cuidei por dois anos, mas
parecia que ele estava mais forte e eu não aguentava mais aquela vida. Assisti
um filme e achei que poderia reproduzir. Comecei a fazer a comida dele separada
e dar pequenas doses de um anestésico fortíssimo que poderia levar ao colapso
de alguns órgãos. Imaginei que, na situação que ele se encontrava, seria até
melhor, iria mais rápido e eu precisava começar a viver.
Eu
fiz isso e percebi que ele estava enfraquecendo, ele estava ficando cada dia
pior até que num domingo frio, ele se foi. Eu nem sofri, achei que seria bom,
eu teria paz, mas não.
Comecei
a me sentir mal, parecia que eu tinha os mesmo sintomas dele e precisei
procurar um médico que dizia que eu não tinha nada, mas porque a sensação de
doença que me afligia?
Fiquei
cada vez pior e, na mente, uma confusão estranha que me tirava da realidade e
fazia cometer coisas ridículas. Meus filhos procuraram um psiquiatra que alegou
que eu estava tendo um surto por causa da morte do meu esposo e me dopou. Eu
fiquei assim por quinze anos, desencarnei e, depois de vagar sendo perseguida
por meu esposo, cheguei aqui e fui esclarecida.
Eu
ainda não concordo, eu ainda não quero vê-lo. Não sei como posso olhar nos olhos
dele e confessar que eu acelerei a sua morte. Sei que ele ficou me cobrando
depois de morto, foi a influência dele que me fez passar mal, como louca, mas
eu tive tudo o que mereci. Eu já paguei. Se não se deve matar nenhum inseto,
quem dirá uma pessoa. Mesmo que tenha sido tão leviano comigo.
ZILMA
19/05/18
--------------------Paula
Alves----------------------
“VIDA
A TOA” “NÃO SEI COMO PODERIA TER SIDO DIFERENTE”
Levaram
tudo, saíram rapelando. Não sobrou nada em casa. Geladeira, fogão, cama, não
sobrou nada. Os credores levaram tudo. Dívida de jogo do meu pai. Eu tinha
vergonha das minhas amigas porque todo mundo sabia que o meu pai era viciado e
a gente estava sempre passando necessidades. A mãe até tentava disfarçar, mas a
vizinhança toda viu levando tudo da nossa casa. Que vergonha! Eu só olhei pela
janela e me encolhi toda.
Minha
mãe arrumava a casa tão bonitinha. Colocava toalhinha, tudo cheiroso e os
pequenos ficavam brincando, enquanto a gente preparava o jantar, mas naquele
dia não tinha jantar. Levaram tudo, guarda roupa com tudo dentro, armário com
tudo dentro, tudo.
Os
vizinhos riram, alguns ficaram chocados, achavam que a gente estava indo
embora, mas o credor fez questão de falar que meu pai era viciado e caloteiro.
Todo mundo ouviu.
Minha
mãe não merecia, mas ele era um verme. Nunca trabalhava para levar dinheiro para
casa, ia direto para o cassino. Que tristeza da mãe. O tempo passou, eu tenho
outras lembranças, mas era sempre do meu pai fazendo coisa errada, minha mãe
passando nervoso por causa dele e meus irmãos crescendo na vadiagem, igual o
pai. Eu quis sair de casa, mas fiquei com pena da minha mãe, aí eu fui ficando
e trabalhando para colocar comida na mesa. Eu não podia suportar quando percebi
que eles estavam me roubando para jogar, para beber.
O
dinheiro do aluguel e das nossas despesas essenciais, eles pegaram para pagar
divida de jogo. Fiquei louca. Fui atrás deles e gritei pela rua, não tive mais
medo de passar vergonha porque eu já estava acostumada. Minha mãe quando viu
passou mal, desmaiou, ficou internada três dias e faleceu.
Que
dor que eu senti. Ela era tudo o que eu tinha de bom. Arrumei minhas coisas e
fui embora, não quis mais saber deles e foi difícil para mim porque por mais
que a gente não queira lembrar, a família não sai da cabeça da gente.
Eu
sei que ficou uma marca em mim. Eu não tive um pai que pudesse me orgulhar, só
motivo de revolta e isso fez eu me isolar porque não podia confiar em nenhum
homem com o pai que eu tive.
Vida
a toa. Não sei como poderia ter sido diferente, nem se podia ter evitado aquela
discussão. Eu acho que não porque a gente é do jeito que é. Agora fica este
vazio que nada consegue preencher. Eu queria que tivesse um jeito de superar
estes pensamentos, estas lembranças. Me informaram que voltaremos mais uma vez,
todos juntos. Os papéis se inverterão. Pais como filhos e filhos como pais. Eu
serei pai para fazer melhor do que ele. Nem sei se eu consigo. Preciso de muito
estudo e conscientização de que cada um, só dá o que tem.
PENÉLOPE
19/05/18
------------------------------------Paula
Alves-------------------------
Foi
tanta graça alcançada. Cinquenta anos servindo a Deus. Fui mocinha para o
convento e nunca me arrependi. Uma família tão pobre que dava até tristeza! Meu
pai me ofereceu para igreja porque tinha feito promessa para Nossa Senhora.
Quase
morri no parto e ele colocou a Virgem para me proteger. Eu nunca falei nada
porque já estava prometida toda a vida. Eu só conhecia isso. Fui com treze anos
e chorei para me separar de minha família, mas sabia que seria bom para mim e para
eles também. Freira.
Eu
logo fiz amizade com as outras irmãs que me receberam com enorme carinho. Foi
tão bom, um quarto tão alvo, roupas tão lindas, tanta disciplina, logo me
acostumei. Eu não senti dificuldade nenhuma não. Tinha todo o prazer de
levantar cedinho e orava contente. Os anos passaram rápidos e pude compreender
que servir o Senhor implica em renúncia e amor, desmedido amor pela humanidade.
Eram
tantos trabalhos oportunos aos necessitados, que só me enchia o coração de
alegria a certeza de que eu poderia ser útil, ser serva. Jesus guiando os
passos e a Virgem enobrecendo minha alma de mulher empenhada em amar o próximo.
Foi
sempre assim, uma existência casta e cheia de trabalho árduo. Cuidando dos
famintos e doentes, das crianças desamparadas, eram muitos os núcleos de
atuação. Mas, eu confesso que cheguei a me preocupar com os pais, por diversas
vezes, sempre entreguei nas mãos do Senhor a minha jornada e também dos meus
genitores.
Eu
fiquei confusa quando cheguei aqui. Não tinha na mente esta visão do paraíso
onde muitos trabalham e se preparam para retornar. Eu não pensava que fosse só
uma etapa. Existiam questionamentos, sempre existem, mas eu não tinha tempo para
pensar, preferi agir em prol dos que precisavam de mim. Não pude duvidar quando
cheguei aqui conduzida por meus pais. Eles estavam comigo nos momentos finais
daquela tuberculose que acabou comigo. Eu estava tranquila, mas achei que tinha
delírios quando os vi nitidamente. Pouco tempo depois, eles me trouxeram para
cá. É tudo muito estranho. Alguns tentam me explicar que não tem errado, só tem
o certo. Cada um crê no que sua mente permite acreditar para a evolução daquele
estágio.
Mas,
e agora?
Eu
sempre trabalhei, sempre servi. Eu desejo voltar a fazer o bem. Em que posso
ser útil?
IRMÃ LEOCÁDIA
19/05/18
------------------------------------Paula Alves------------------------------
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Foto cedida por Magno Herrera Fotografias
“DEPOIS DE VELHOS E MUITO MAIS
EXPERIENTES, PASSAMOS A DAR VALOR PARA AS COISAS MAIS SIMPLES DA VIDA”
Eu
fiquei desesperado quando me vi doente, em parte porque percebi que o fim
estava próximo e a insegurança tomou conta de mim. Como você ficaria?
Depois
que nossos filhos cresceram e constituíram família, éramos só nós dois. Tudo
começa com o casal e, depois de muito tempo, após ter criado os filhos e vê-los
se tornarem independentes, nós voltamos a ser, apenas um casal. Conseguimos
voltar a ser um do outro. Nos olhamos como antigos namorados, redescobrimos o
prazer de ficarmos juntos e unidos num mesmo ideal. Depois de velhos e muito
mais experientes, passamos a dar valor para as coisas mais simples da vida.
Ter
o prazer de nos sentarmos para conversar, observar o mar e andar de mãos dadas.
Tudo foi bom, todo o tempo que passamos juntos foi bom e eu não queria perder.
Eu não queria morrer e te deixar sozinha. Eu sabia que nossos filhos te
apoiariam. Eu sabia que você teria nossas lembranças, mas e se fosse o inverso?
Eu
sofreria demais.
Eu
pensei que nossos meninos iriam continuar com suas vidas corridas, cuidando de nossos
netos e você na solidão, na tristeza. Eu me preocupei. O fato é que tudo passou
muito rápido. Foi tão bom! Quando a doença chegou, eu não quis te preocupar e
acreditei que eu teria um fim, mas não foi nada disso. Eu também sofri quando
desencarnei. Eu queria ficar em nossa casa. Eu tentei falar com você, fazer com
que me ouvisse. Eu tinha tantas coisas para falar, e ainda tenho, eu precisava
te dizer que estava errado, não se morre.
Eu
precisava te fazer entender que quando o corpo morre, a gente pensa como antes,
eu fiquei confuso e atormentado, sim é verdade que fiquei, mas continuei nutrindo
o mesmo amor. Talvez, maior porque sem o corpo as sensações aumentam e o sentir
é muito mais, muito mais intenso. Eu queria te mostrar, mas você só chorava.
Que triste!
Eu
estava tão perto. Fiquei ali por meses, vendo sua tristeza sem poder ajudar.
Tão triste! Até que consegui enxergar minha tia Marília. Ela conversou comigo e
me auxiliou para chegar até aqui nesta colônia onde me tratam tão bem, com
tanto respeito Tássia.
Eu
ainda tenho dificuldades para compreender porque é uma realidade diferente da
que nós achávamos existir. Eu te espero. Desejo que você viva bastante para realizar
tudo o que está nos seus planos. Desejo que você seja sempre feliz, como antes.
Sinta-se plena, você é um anjo na minha vida e eu existo. Cada vez melhor,
cheio de vida e de lucidez, agora posso perceber tudo e estou entendendo até
nossas dificuldades, a doença, tudo.
Mas,
eu te espero amor. Aqui não tem cachos de uva, há-há, aqui tem muitas coisas a
serem realizadas, muito a fazer e eu sei que o tempo vai passar e em breve
estaremos juntos, por isso, viva intensamente com nossa família. Eu te amo para
sempre.
JOÃO
MIRANDA
27/05/18
--------------Paula
Alves-----------
“ATRAÍMOS
A LEI E PAGAMOS TODOS JUNTOS”
Quando
eu poderia imaginar que aquele helicóptero daria problemas? Eu não podia supor,
além do mais, seria burrice da minha parte, me atrever a ser inconsequente com
um meio de transporte que estava me conduzindo.
Eu
fui tolo, isso eu fui mesmo porque não questionei quando o técnico acusou um
pequeno defeito. Eu aceitei o que ele disse e segui em frente numa viagem que
prejudicou a mim e outras dez pessoas. A gente não prejudica apenas quem perde
a vida, é um efeito cascata. Eu e mais três tivemos uma queda fatal, mas todos
nós tínhamos família e todos sofreram muito. Eu destruí famílias com meu comportamento
leviano. Já me disseram que eu preciso me perdoar, mas é quase impossível.
Depois
que o acidente aconteceu, eu fiquei em destroços. Fiquei com o corpo desfacelado
e encontrei aqueles que estavam no voo comigo. Todos insanos, completamente
desequilibrados. Não dava para compreender o que tinha acontecido porque
estávamos muito arruinados fisicamente parecia um filme de terror. Nós mesmos
estávamos assustando uns aos outros. Demorou a entender. Nos unimos e, sem
querer, conseguimos chegar na primeira casa. Foi ouvindo uma conversa entre a
família da moça que estava conosco que entendemos que ocorreu um acidente que
destruiu nossas vidas. Eu fiquei perdido, atordoado, eles também. Nos ajudamos
e fomos socorridos. Levou muito tempo para entender porque tinha que passar por
tudo aquilo. A verdade é que nós sempre nos envolvemos com nossos afins ou
somos atraídos pelos planos. São reajustes que devem acontecer.
Em
outras vidas, nós estivemos ligados numa tramoia. Acreditávamos que, como
cientistas, pudéssemos obter a cura de algumas doenças e, assim, teríamos o
reconhecimento merecido. Nós fomos terríveis ao utilizarmos cobaias vivas. Eram
indigentes, moradores de rua. Pessoas que estavam jogadas e não tinham nenhum
vínculo com ninguém, nenhum membro da sociedade sentiria a falta deles.
Houve
muito horror e muitas coisas saíram erradas, nós desfizemos o grupo, mas nunca
pagamos pelos crimes. Atraímos a Lei e pagamos todos juntos. Eu ainda preciso
apagar tudo isso da memória, preciso me perdoar mais uma vez. Nem sei se
consigo.
GERT
27/05/18
--------------Paula
Alves------------
“QUANDO
SEM REVOLTA CONSEGUIR ELEVAR A MAIORIA, AÍ SIM É PROGRESSO”
“QUANDO
EXISTE MORTE, INJUSTIÇA E SOFRIMENTO NÃO É AVANÇO, NÃO É PROGRESSO”
Era
com babosa que a gente fazia curativos. Ah! Fio, a gente tinha que usar a
sabedoria dos ancestrais porque na nossa terra não tinha médico, nem remédio.
Criança crescia forte e era bem tratada pelos pais. Era tão bem tratada pelos
pais que também tratavam bem os pais e avós quando estavam crescidinhos.
Tem
gente que estuda tanto Fio, mas não tem o ensinamento do amor na vida deles,
então, tudo o que aprende não germina. É tudo perdido Fio, tudo. Porque a
pessoa só aprende as coisas pra se exibir, não é pra contribuir para o bem dos
demais, dos seus irmãos. A gente sabia coisa que passava do pai para o filho e
os filhos sabiam que tinham tanto que aprender que prestavam toda a atenção.
Era lindo ver a mocinha fazendo a comida enchendo de erva para manter o corpo
inteiro, forte. Elas cuidavam das mães que estavam parindo os irmãos menores.
Cuidavam de tudo e eu estava sempre por ali pra apara a criança. Perdi as
contas de quantas vieram nas minhas mãos. As ervas davam a saúde, do mato, da
natureza, a gente extraía tudo o que precisava e do céu a gente sabia que vinha
toda a nossa sensatez, todo o nosso conhecimento.
Maior
respeito com o Criador Fio. Sempre foi assim. Um dia vi todo mundo correndo,
criança gritando, gente malvada que chegou destruindo tudo, tacando fogo nas
minhas ervas, destruindo nossas casas que eles chamavam barracos. Gente
criminosa que chegou afirmando que ia trazer o progresso. Gente que impregnou a
mata com sangue e dor. Ah! Fio muita dor... Eu vi coisas horríveis, não dá nem
pra descrever procês. A moça tá sentindo. Tudo isso aí foi o que eu senti, essa
dor no peito de ver minha gente se maltratada, humilhada como se a gente fosse bicho.
Tá vendo Fio as lembranças que essa véia carrega na mente?
É
isso que não apago. Eu não sou má não. Não queria sentir mágoa. Quem sou eu Fio
pra recriminar alguém? Também já errei muito, mas foram muitos dos meus
judiados por madeira nobre. Por dinheiro. Revolução existe quando trás o bem,
quando permitir enobrecer a alma, mostrar dignidade pra um povo. Quando sem
revolta conseguir elevar a maioria, aí sim é progresso. Quando existe morte,
injustiça e sofrimento não é avanço, não é progresso. Eu vou viver muito, mas
não vou entender essa gente.
RIVOLINA
27/05/18
-----------------------------Paula
Alves---------------------
“O
CONHECIMENTO É O TESOURO QUE NINGUÉM NUNCA VAI TIRAR DE VOCÊ”
Os
números brotavam na minha mente. Como que dançando, era tudo tão simples, tão
fácil. Como uma sugestão, eu sempre sabia o resultado. Meu pai percebeu e foi
tirando onda, me levando pra exibição com os amigos, comecei pequeno e eles se
admiravam. Era impressionante o que um menino de seis anos podia fazer com os
números. O pai foi brincando e ganhou um dinheiro na porta do bar.
Acho
que ele começou a ficar ganancioso porque era uma boa oportunidade de ganhar
dinheiro sem fazer muito esforço. Meu pai era metalúrgico e chegava tão cansado,
reclamando. A mãe também trabalhava em casa de família e estava com a gente só
no final de semana. Eu ficava com a Cássia, minha irmã. O pai percebeu que
podia ganhar dinheiro com a minha habilidade numérica. Eu me deixei levar,
amava meu pai e o que ele me pedia não podia resistir, era meu pai. Eu nem
sabia que não estava certo. Ele foi me apresentando por aí e eu fui parar no circo.
Crescendo e ganhando dinheiro com meu QI. Meu pai ficou fascinado com meu
talento e minha mãe descobriu que o circo estava me querendo, eu rendia um bom
dinheiro. Minha mãe ficou enfurecida com o pai e eles discutiram feio. Ela
pegou a gente e disse que ia embora, que eu era criança e tinha que estudar.
Ela
xingou o pai e ele bateu nela. Nunca esqueci. A mãe tinha o sonho de estudar,
queria isso pra gente. Ela levou a gente embora e o pai não deixou por menos.
Quando descobriu onde estávamos, ele foi até nossa casa e me levou de lá. A
cássia ficou chorando e eu nunca mais vi minha irmã, nem minha mãe. Cresci na
revolta. Nunca perdoei meu pai. Quando entendi tudo o que tinha acontecido,
depois de fazer muitos trabalhos em circos, depois de ver meu pai se embriagar
e gastar todo o nosso dinheiro, eu conclui que era uma fonte de renda para o
meu pai. Ele só me usou, me tirou da mãe e privou do seu convívio. Eu fiquei
com raiva da minha inteligência.
Se
eu fosse como as outras crianças, se eu tivesse um raciocínio normal, ele não
tinha feito o que fez. Com quatorze anos, eu fugi do meu velho. Tentei
encontrar as duas, mas em vão, nunca achei. Fiquei tão perdido que me viciei.
Não queria saber mais nada. Não queria calcular, mas a vida nos surpreende e
não se pode lutar contra o conhecimento. Tudo o que se assimila é nosso bem
mais precioso. O conhecimento é o tesouro que ninguém nunca vai tirar de você.
Por mais que se tente camuflar ou bloquear, não dá. É natural. Eu fui trabalhar
empacotando no supermercado e percebi que a caixa, uma mulher linda, mas
desnorteada, desligada, percebi que ela tinha calculado errado e ia entregar o
troco errado. Eu avisei. Ela brigou comigo e o cliente confuso pediu para
chamar o gerente. Ele foi obrigado a passar a compra toda novamente e
comprovaram que eu estava certo. Todos se surpreenderam e o cliente me ofereceu
emprego na Bolsa. Claro que minha vida mudou e a moça linda virou minha esposa.
Eu
não pensei que pudesse mudar tanto. Foi bom ter tido um emprego digno com minha
capacidade intelectual. Foi bom ter me casado com a Cecília e ter tido a minha
família com filhos queridos. Mas, eu ainda sinto falta da minha mãe e da minha
irmã. Ainda é difícil entender por que meu pai fez tudo isso por dinheiro.
DANIEL
27/05/18
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